O Morto-Vivo
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Passou o dia inteiro a ser albarroado por toda a gente. Foi pisado, foi grosseiramente atropelado, por dezenas de pessoas na rua, que nem sequer paravam para pedir-lhe desculpas.
É a vida da cidade.
As pessoas já nem se vêem umas às outras, já não reconhecem a existência umas das outras.
É a vida agitada da cidade.
No trabalho, ninguém lhe dirigiu uma palavra que fosse. Era como se lá não estivesse. Fez o trabalho que tinha a fazer e nada mais. Saiu. Voltou para casa. Um dia a gente desaprende de falar. Os japoneses têm razão. Fazem robots, fazem bonecos. Os japoneses têm razão.
É a vida desumanizada da cidade.
Tirou o jantar do congelador. Pô-lo no microondas. Tirou um garfo da gaveta, colocou-o no tabuleiro, ao lado da lata de refrigerante. PLIM! Ligou a televisão, sentou-se no sofá, ouviu as notícias. Era a sua rua. Na Televisão! Era o seu prédio! Nas notícias! Era...o seu andar? A sua pessoa? O seu nome? Era! Era ele! Morto! Numa explosão de gás. Três feridos. Ele morto e não sabia. Ainda bem que viu as notícias.
É a vida mediatizada da cidade.
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